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terça-feira, 9 de novembro de 2010

TJ paulista manda prefeitura indenizar servidores

Conjur
9 de novembro de 2010
Por Fernando Porfírio

A fatura pela chamada “política da transparência” colocada em prática pelo prefeito Gilberto Kassab ao divulgar nomes, cargos e salários dos servidores municipais está pesando nos cofres públicos. Nesta segunda-feira (8/11), o Tribunal de Justiça condenou a prefeitura paulistana a pagar mais um conjunto de indenização, por danos morais, no valor de R$ 100 mil a 20 servidores que, segundo eles, tiveram sua intimidade violada. A decisão, por maioria de votos, é da 6ª Câmara de Direito Público. Cabe recurso.

O município tem 147 mil funcionários vinculados à administração direta e outros 15 mil ligados à administração indireta. O prefeito paulistano, Gilberto Kassab (DEM), quando da apresentação da medida a saudou como uma “ferramenta capaz de transformar cada cidadão paulistano em um verdadeiro corregedor da administração municipal”.

A turma julgadora do Tribunal de Justiça de São Paulo fez uma interpretação diferente. Para os três desembargadores, a lista divulgada no portal da Prefeitura na Internet não foi a melhor forma de demonstrar transparência e afronta diretamente a Constituição Federal. De acordo com o relator, Leme de Campos, a Prefeitura violou e expôs a intimidade de seus servidores — o que não é permitido pela legislação. O relator arbitrou em R$ 5 mil o valor da indenização para cada servidor que ingressou na ação.

“Mostra-se descabido o argumento da municipalidade no sentido de que sua conduta estava fundamentada nos princípios da publicidade, moralidade e supremacia do interesse público”, sustentou o relator. Para Leme de Campos, esses princípios não são absolutos, devendo a Administração observar os direitos fundamentais, a intimidade e a vida privada.

O revisor, Sidney Romano, foi ainda mais enfático. Disse que o ato do prefeito foi além expondo os servidores ao escárnio e ao perigo. “No caso, se pretendia tornar a Administração Pública transparente deveria divulgar os cargos e funções e os respectivos salários, sem apontar quanto cada servidor estava recebendo como vencimentos. Isso é jogar para a platéia”.

Sidney Romano explicou que a Constituição Federal garante o direito à intimidade a todo o cidadão. Na opinião do revisor, não há motivo para divulgar o nome do servidor e seu salário. Porém, a publicidade dos gastos do governo é de interesse público, disse ele.

O terceiro juiz, Carlos Eduardo Pachi concordou com o raciocínio dos colegas, mas entendeu que o caso não configurava dano moral capaz de exigir indenização. Para ele, a Prefeitura se equivocou ao divulgar o nome e os salários de cada um de seus servidores. No entanto, no entendimento de Pachi, o ato não maculou a honra nem violou a intimidade a ponto de ensejar indenização por dano moral.

Mais condenações
Em agosto, o município de São Paulo foi condenado a indenizar uma funcionária que teve o valor de seu salário publicado no “Portal da Transparência”. A indenização, ainda de primeira instância, foi fixada em 10 salários mínimos pelo juiz Luiz Sérgio Fernandes de Souza, da 8ª Vara da Fazenda Pública.

Na sentença, o juiz afirma que em nenhum momento a Constituição exigiu a publicação do nome do servidor com a divulgação do valor de sua remuneração. “O artigo 39 diz apenas que todos os poderes da República, nos diversos níveis da Federação, darão a público, anualmente, os valores do subsídio e da remuneração dos cargos e empregos públicos, o que já ocorria antes mesmo do chamado ‘Portal da Transparência’.”

O juiz afirmou que a situação que desencadeou o processo foi a publicação do nome dos servidores acompanhado dos respectivos salários. Segundo notícias veiculas na imprensa, isso causou medo de assaltos uma vez que alguns salários haviam sido publicados incorretamente, com valores bem acima.

“É certo que a informação relativa à retribuição do cargo há de ser feita anualmente, mas sem necessária correlação com o nome do titular do cargo ou do empregado da administração pública, sob pena de invasão da esfera da privacidade do servidor”, diz Fernandes de Souza.

Causa do litígio
Em junho de 2009, a prefeitura de São Paulo causou grande polêmica ao publicar no Portal da Transparência diversas listas com os nomes, cargos e salários dos servidores. A prefeitura alegava que a publicação dos vencimentos dos servidores tinha como objetivo obedecer à Constituição Federal e respeitar os princípios da publicidade e da transparência.

Houve idas e vindas de liminares entre varas da Fazenda Pública e a presidência do Tribunal de Justiça, na época nas mãos do desembargador Vallim Bellocchi.

Também este ano, a Justiça paulista mandou outra fatura da conta que será paga pelo erário. A sentença determina que os cofres do município paguem o valor correspondente a 20 salários mínimos para cada uma das cinco servidoras que ingressaram com ação de indenização contra a prefeitura paulistana.

A decisão foi tomada pela juíza Paula Micheletto, da 8ª Vara da Fazenda Pública. A magistrada entendeu que a prefeitura, ao divulgar a lista na internet com dados pessoais dos servidores, entre eles o valor dos vencimentos, extrapolou os limites das normas (Lei Municipal 14.720/08 e Decreto 50.070/08) que regulamenta a matéria. A juíza não aceitou o argumento da prefeitura de que agiu em respeito aos princípios constitucionais da publicidade, transparência e moralidade.

“Não se discute, no caso em tela, valores como transparência, publicidade e informação à sociedade quanto aos vencimentos referentes aos cargos públicos, bem como as próprias vantagens referentes às promoções e evoluções na carreira, que deverão ser, sim, observados e garantidos”, afirmou a juíza.

De acordo com ela, o que está em debate perante o Judiciário é o fato de o Executivo invadir a esfera pessoal de cada servidor público, colocando dados pessoais de sua vida, em lista com acesso mundial, principalmente em meio a onda de violência que toma conta do país.

A juíza sustentou, ainda, que a ordem constitucional, ao mesmo tempo que garante valores como publicidade e informação, também garante a privacidade e a intimidade das pessoas. “Portanto, a conduta da municipalidade extrapolou os limites legais e constitucionais, causando para as autoras patente dano moral”, completou.

Derrota especial
Em março, o prefeito Gilberto Kassab já havia sofrido outra derrota. Desta vez, no Órgão Especial do Tribunal de Justiça. A corte paulista obrigou o chefe do Executivo municipal a retirar da página eletrônica da prefeitura os nomes, cargos e vencimentos dos servidores públicos que trabalham na Prodam (Empresa de Processamento de Dados do Município).

Por votação unânime, o colegiado entendeu que a publicação viola a legalidade e a privacidade dos funcionários. A decisão atendeu Mandado de Segurança apresentado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e de Informática. A entidade entrou com recurso a favor de servidores públicos municipais que trabalham na Prodam (Companhia de Processamento de Dados do Município).

A defesa sustentou que o prefeito era o responsável pela violação de princípio constitucional e que os trabalhadores tinham direito líquido e certo de não terem seus salários expostos a consulta pública.

“O ato administrativo do prefeito paulistano viola a intimidade e a privacidade dos servidores públicos municipais”, anotou em seu voto do relator do recurso, desembargador Ademir Benedito. “Em nome da publicidade e da transparência, o prefeito não poderia divulgar dados sigilosos e expor, desnecessariamente, a intimidade dos funcionários”, completou.

A entidade sindical pediu providência contra ato administrativo atribuído ao prefeito. O sindicato argumentou que a Lei 14.720/08, regulamentada pelo Decreto 50.070/08, autoriza a publicação dos nomes, cargos e lotação dos funcionários, mas não a divulgação de vencimentos.

Apontou ainda que o ato do prefeito viola a legalidade e a privacidade das pessoas, em nítida afronta a dispositivos constitucionais. Sustentou que Kassab é autoridade coatora (responsável) ao contrário de posição reconhecida anteriormente pela Justiça de que a ordem partiu do secretário municipal de modernização, gestão e desburocratização.

 

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