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terça-feira, 20 de julho de 2010

PEC 443 emparelha salários na advocacia pública

Conjur
20 de julho de 2010

O Texto Maior definiu, no caput do art. 131, as funções institucionais da Advocacia-Geral da União (1). Com efeito, a representação judicial e extrajudicial da União e a consultoria e o assessoramento jurídicos do Poder Executivo são deveres funcionais a serem exercitados no âmbito da instituição ou, em outras palavras, pelo sistema de órgãos jurídicos da Advocacia Pública Federal.
Ocorre que o mesmo artigo 131 da Constituição, agora no parágrafo segundo, prescreveu que o ingresso nas classes iniciais das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União será efetivado por meio de concurso público de provas e títulos (2).
O disposto no artigo 131, parágrafo segundo, merece especial atenção. Afinal, a exigência de concurso para ingresso nos cargos públicos já está inscrita no art. 37, inciso II, da mesma Carta Magna (3). Não é crível admitir que o comando consiste em mera repetição da salutar e republicana definição constitucional. São outras, portanto, as finalidades do parágrafo segundo do artigo 131 da Constituição.
Os dois sentidos mais importantes do dispositivo em comento, notadamente quando realçado o seu locus normativo, como parágrafo do artigo 131, são: a) a fixação do status ou dignidade constitucional das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União (4) e b) a definição de que as funções institucionais da Advocacia-Geral da União são exercitáveis pelos integrantes de suas carreiras jurídicas (5).
O primeiro sentido está expressamente reafirmado no Texto Maior. Diz o artigo 29, parágrafo segundo, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (6), que o procurador da República, então advogado da União, representante judicial da Fazenda Pública Federal, poderia optar por integrar as carreiras da Advocacia-Geral da União. Somente a mais torpe hermenêutica masoquista poderia imaginar a existência e manutenção de tamanhas discrepâncias entre as duas classes de funções essenciais à Justiça viabilizadoras de um descenso remuneratório por ato de vontade, quando essa mesma redução é interditada pela via normativa, conforme a cláusula da irredutibilidade salarial consagrada no artigo 37, inciso XV, da Constituição (7).
Assim, o status constitucional das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União (8), em presença simétrica com as carreiras que dão vida às demais funções essenciais à Justiça, exige a fixação, no plano legal, de um regime jurídico paritário. Tal paridade deve ser efetivada em remunerações estabelecidas nos mesmos níveis e em prerrogativas e sujeições similares e condizentes com o exercício das atribuições específicas.
Ressalte-se, neste passo, um quadro dos mais perversos para com a Advocacia Pública Federal. Tratam-se dos “esquecimentos” da fixação das prerrogativas necessárias para o exercício isento e eficiente das funções desse estratégico segmento do Estado e da definição de patamares remuneratórios compatíveis, evitando, inclusive, o “canibalismo” entre carreiras jurídicas, com as mais nefastas consequências daí decorrentes. Por outro lado, as sujeições são “convenientemente”, e de forma isolada, “lembradas”. Observe-se que o exercício da advocacia pelos membros da Advocacia-Geral da União somente nas funções institucionais foi consagrado com acerto no artigo 28, inciso I, da Lei Complementar 73, de 1993 (9). Recentemente, por força do artigo 6º da Lei 11.890, de 2008, decorrente da conversão da Medida Provisória 440, de 2008, foi veiculada uma nova sujeição ou restrição: “... regime de dedicação exclusiva, com o impedimento do exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada, potencialmente causadora de conflito de interesses, ressalvado o exercício do magistério, havendo compatibilidade de horários”.
Mas nem tudo está “perdido” no plano institucional. A histórica resistência dos formulados da política de pessoal no Poder Executivo, no sentido de não enxergarem os ditames constitucionais antes mencionados na fixação dos parâmetros remuneratórios das carreiras jurídicas da Advocacia Pública Federal, está logrando o devido reparo no âmbito do Congresso Nacional no exercício do papel de constituinte derivado.
Com efeito, o ilustre deputado federal Bonifácio de Andrada liderou a apresentação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC 443/2009) que consagra expressamente a paridade remuneratória entre as carreiras que dão substância às funções essenciais à Justiça (10).
O projeto em questão foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. A pertinente Comissão Especial para análise da matéria foi instalada tendo como presidente o influente deputado federal José Mentor e, como relator, o experiente e respeitado deputado federal Mauro Benevides.
Paralelamente à justeza da causa, uma forte mobilização das entidades representativas dos vários segmentos da Advocacia Pública (11), bem como dos próprios advogados públicos, aponta para a aprovação da PEC 443/2009 na aludida Comissão Especial da Câmara dos Deputados (12).
Assim, o constituinte derivado, em passos certos e seguros, caminha para explicitar, para além de qualquer dúvida e dobrando qualquer resistência indevida, a paridade remuneratória entre as carreiras que o constituinte originário qualificou como essenciais à Justiça.

NOTAS:

(1) “Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo”.
(2) “§2o - O ingresso nas classes iniciais das carreiras da instituição de que trata este artigo far-se-á mediante concurso público de provas e títulos”.
(3) “II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional no 19, de 1998)”.
(4) “Analisando a concepção de agentes públicos adotada pela Constituição de 1988, Moreira Neto (1991, p. 245) aduz que os agentes que exercem as funções essenciais à justiça (dentre os quais se incluem os membros da Advocacia-Geral da União) são verdadeiros ‘agentes políticos’. Isto porque ‘há muito que o direito político deixou de considerar o provimento eletivo como o critério definitório do político: o traço diferenciativo deslocou-se para a indisponibilidade da função pública desempenhada’ (MOREIRA NETO, 1991, p. 244). Tratam-se, portanto, de agentes públicos de existência necessária (e não contingente), a qual se prende ‘ao exercício diferenciado de funções derivadas do Poder Uno do Estado, estritamente vinculadas à sua finalidade e, por isso, com cargo de autoridade própria’ (MOREIRA NETO, 1991, p. 244). Tal concepção de agente político, por óbvio, pressupõe a exclusividade no exercício das atribuições de tais agentes, as quais, como regra, não podem ser desempenhadas por terceiros”. MACEDO, Rommel. Advocacia-Geral da União na Constituição de 1988. São Paulo: LTr, 2008. p. 57. A referência a Moreira Neto corresponde ao eminente jurista Diogo de Figueiredo Moreira Neto.
(5) “No que tange à exclusividade no exercício das competências da Advocacia-Geral da União por parte de membros de suas carreiras (com exceção do próprio Advogado-Geral da União, de livre nomeação pelo Presidente da República), isto se revela corolário da própria leitura dos §§ 1o e 2o do art. 131 da Constituição de 1988. Clarividente, assim, a regra de que as referidas competências não podem ser exercidas por pessoas não integrantes das carreiras da instituição”. MACEDO, Rommel. Advocacia-Geral da União na Constituição de 1988. São Paulo: LTr, 2008. p. 57.
(6) “§ 2o - Aos atuais Procuradores da República, nos termos da lei complementar, será facultada a opção, de forma irretratável, entre as carreiras do Ministério Público Federal e da Advocacia-Geral da União”.
(7) “XV - o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;”
(8) As funções de assessoramento, consultoria e representação judicial e extrajudicial da União são estratégicas para o Estado. Afinal, a existência e a continuidade de cruciais decisões governamentais e de imprescindíveis políticas públicas dependem necessariamente das várias formas de atuação jurídica da Administração Pública. Ademais, o resguardo do patrimônio público, em sentido amplo, contra toda sorte de investidas indevidas depende de uma Advocacia Pública forte e aparelhada, em todos os sentidos, para resistir aos ataques oriundos dos interesses mais diversificados.
Nessa linha, o constituinte foi sábio. Não só criou a instituição Advocacia-Geral da União, mas também previu expressamente o seu princípio ativo, a sua sustentação visceral: as carreiras jurídicas da instituição. Depreende-se, pois, do discurso constitucional que instituição e carreiras formam uma necessária simbiose. Não existe um sem o outro.
Cabe, neste passo, uma palavra sobre a aguerrida carreira de Procurador Federal, aqui abrangidos dos Procuradores do Banco Central do Brasil. Essa carreira convive com uma situação muito peculiar. Com efeito, os Procuradores Federais não são Membros da Advocacia-Geral da União, nos termos do art. 2o, parágrafo quinto, da Lei Complementar n. 73, de 1993. Ocorre que a Procuradoria-Geral Federal, habitat natural dos Procuradores Federais, integra, de fato e de direito, a Advocacia-Geral da União. Assim, é de todo conveniente utilizar a expressão “carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União” envolvendo os Advogados da União, os Procuradores da Fazenda Nacional e os Procuradores Federais.
Convém destacar que o discurso da Lei n. 10.480, de 2002, particularmente o seu art. 9o, deve ser tomado com o devido cuidado e de forma sistêmica. Não guarda nenhuma lógica ou sentido a existência de um órgão (a PGF) despersonalizado e vinculado, portanto, estruturalmente alheio, à Advocacia-Geral da União. Notadamente, quando esse órgão não integra a Presidência da República ou algum dos Ministérios. Assim, a leitura racional do comando legal, segundo os cânones da ordem constitucional brasileira, impõe a conclusão de que a PGF integra, compõe ou faz parte da Advocacia-Geral da União, assim como a Procuradoria-Geral da União e a Consultoria-Geral da União.
Nesse sentido, observe-se que as últimas leis orçamentárias da União não contemplam orçamentos separados para a AGU e para a PGF. As dotações orçamentárias para o funcionamento da PGF estão inseridas no âmbito da AGU.
Infelizmente, alguns setores da Advocacia Pública Federal alimentam um triste e descabido tratamento preconceituoso para com os valorosos Procuradores Federais. Trata-se de preconceito por preconceito. Uma postura que claramente não colabora para o aprimoramento e o fortalecimento da Advocacia Pública Federal.
(9) “Art. 28. Além das proibições decorrentes do exercício de cargo público, aos membros efetivos da Advocacia-Geral da União é vedado: I - exercer advocacia fora das atribuições institucionais;”
(10) Eis a redação original da proposta apresentada: “o subsídio do grau ou nível máximo das carreiras da Advocacia-Geral da União, das Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal corresponderá a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, fixado para os Ministros do Supremo Tribunal Federal, e os subsídios dos demais integrantes das respectivas categorias da estrutura da advocacia pública serão fixados em lei e escalonados, não podendo a diferença entre um e outro ser superior a dez por cento ou inferior a cinco por cento, nem exceder a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal fixado para os Ministros do Supremo Tribunal Federal, obedecido, em qualquer caso, o disposto nos artigos 37, XI, e 39, § 4º”.
(11) Merece destaque a atuação enérgica do Fórum Nacional da Advocacia Pública Federal (reunião de sete entidades representativas dos advogados públicos federais: ANAUNI-ANPREV-ANAJUR-ANPAF-APBC-APAFERJ-SINPROFAZ) sob a presidência do incansável Procurador da Fazenda Nacional João Carlos Souto.
(12) Nesse sentido, o eminente Deputado Federal Mauro Benevides, relator da proposição, apresentou manifestação favorável à proposta, incorporando, com justiça, os Defensores Públicos, em reunião da Comissão Especial realizada no dia 14 de julho de 2010.
Aldemario Araujo Castro

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